25 de jul. de 2015

Viagem Pelo Cachoeira



O rio Cachoeira nasce nas fraldas da Serra do Itaraca, no município de Vitória da Conquista. Banha terras deste município e aparece em Itambé. Depois de percorrer quilômetros, chega a Itapé com o nome de Colônia quando então se encontra com o rio Salgado. Seu nome de rio Cachoeira foi dado pelos capuchinhos italianos, em meados do século XVIII, no período da catequese.

Como Colônia banha o atual município de Itaju, antigo distrito de Itabuna,. Depois de receber as águas do Salgado o seu mais importante afluente, pouco acima de Itapé, muda o nome, passando a ser Cachoeira até desaguar no Oceano Atlântico. Antes de sua chegada ao mar de Ilhéus, encontra-se com os rios Santana e Fundão, formando a chamada Coroa Grande.

Nesse percurso, da Serra de Itaraca até o oceano, através de mais de 300 quilômetros, as suas águas passam por uma das mais importantes regiões da Bahia, sendo fator principal para a subsistência de duas grandes riquezas do Estado: cacau e pecuária.

Curiosamente, apesar de seu nome, o rio não possui, ao longo do seu curso, nenhuma cachoeira importante. Muitas ilhas existiram antes cercadas por suas águas: Marimbeta, por muito tempo conhecida como Ilha do Jegue, Sequeiro Grande, Bananeiras, Sempre Viva, Quiricós e outras. De todas elas agora existem apenas lembranças.

O principal afluente do rio Cachoeira é o Salgado, que antes banha as terras de Ibicaraí, Floresta Azul, Firmino Alves, Itororó e Santa Cruz da Vitória. São ainda seus afluentes Piabanha, Catolé, Duas Barras, Sucuriúba, Ponte, Sapucais, Areia, Primavera, Jacarandá, e Itaúna, este último, entre Salobrinho e Cachoeira, para alguns teria sido a origem do atual nome da cidade de Itabuna.

A história do rio Cachoeira começa justamente onde termina o seu curso: a entrada do porto de Ilhéus. Ali, em 1535, suas águas foram testemunhas da chegada de Francisco Romero, que vinha tomar posse das cinqüenta léguas de terras doadas por D. João III, pela Carta Régia de 25 de abril de 1534, ao escrivão da Corte de Portugal, Jorge de Figueiredo Correia, e que se constituíam na Capitânia dos São Jorge dos Ilhéus. Pode-se dizer que este rio assistiu e acompanhou ainda as lutas dos donatários e ouvidores da capitania contra os terríveis Aimorés, Tupiniquins e Guerens, guardando na lembrança das águas os nomes de Lucas Giraldes, D. Helena de Castro, Braz Fragoso, Vasco Fernandes Coutinho, Antonio da Costa Camelo, Luiz Freire de Veras, Francisco Nunes Costa, Balthazar da Silva e outros.

Em 1595, suas águas deram passagem aos franceses, que saquearam e devastaram a pequena aldeia de Ilhéus. Mias tarde abrigariam também os soldados da esquadra do almirante Lichthardt, que desembarcaram no Pontal, fazendo dali a cabeça de praia para assalto e saque a Ilhéus. Em ambas as invasões, os estrangeiros foram heroicamente repelidos pelos poucos habitantes da Vila, com a intercessão da Virgem Maria, originando daí a lenda e culto de N. S. das Vitórias.

Segundo Francisco Borges de Barros, no livro “Memórias do Município de Ilhéus “ , edição de 1915, foi em 1553 que tiveram início as explorações nas margens do Cachoeira. Apenas na parte que era navegável, trecho entre Ilhéus e Banco da ´Vitória.. Já nesse tempo, o Padre Luis Soares Araújo, referindo-se ao rio, escrevia: “ Caudaloso rio chamado o da Cachoeyra da vila, capaz de navegar sumacas, barcos, lanchas e canoas; não há quem lhe saiba o seu princípio, por vir muito de dentro do Sertão e que todos afirmam que vem das minas...”.

A exploração e a catequese nas margens do Cachoeira coube ao padre Manoel da Nóbrega, juntamente com os catequistas Francisco Pires, Aspicuelta Navarro, Manoel Chaves e outros. Os trabalhos dos jesuítas se desenvolveram mais para as regiões de Porto Seguro, Itacaré, Boipeba, Cairu e Canavieiras, mas alguns deles se ocuparam dos índios que viviam nas margens do rio, no referido trecho navegável.

Mais tarde, em 1570, durante a época das bandeiras, uma das expedições chefiada por Martins Carvalho penetrou pelas margens do rio indo a um ponto além do Banco da Vitória. Um personagem de destaque nas expedições, ao longo das margens do rio Cachoeira, foi o capitão português João Gonçalves da Costa. Contam várias histórias a respeito da ação devastadora contra os índios, destacando a sua crueldade, a ponto de Saint Hilaire, no seu relatório “Voyage au Perou”, assim se expressar:“ o quadro de destruição e atos de selvageria praticados por João Gonçalves de Costa, contra os fracos restos de índios das margens do Cachoeira e Rio de Contas, desafia ao mesmo tempo a sensibilidade do homem de coração bem formado”.

Em “Capitania de São Jorge de Ilhéus”, João Silva Campos registra também a ação devastadora praticada contra os índios Guerens por João Amaro, contratado pelo governador da Província, Afonso Furtado de Mendonça. Muito sangue, muita crueldade e as vidas de milhares de índios foi o preço da conquista e exploração às margens do rio Cachoeira.

No princípio do século XVIII, os frades capuchinhos deram início à catequese dos poucos índios que sobreviveram às carnificinas de João Gonçalves e João Amaro. Do trabalho catequético desses piedosos e bravos frades, foram surgindo ao longo do curso do Rio Cachoeira aldeias, povoados, colônias e missões, como Banco da Vitória, Cachoeira de Itabuna, Ferradas, Cachimbos, Catolé e outras.

Uma dessas povoações muito progrediu, foi a de Cachoeira de Itabuna, no tempo de Weyll e Samaraker, colonos estrangeiros que fundaram ali às margens do rio Cachoeira e seu afluente Itaúna uma colônia que ficou muito afamada pelo desenvolvimento da cultura de cana de açúcar, arroz, cacau e fumo, produtos que chegaram a ganhar medalhas de ouro nas exposições de Viena, Turim e na corte do Brasil.

Também a povoação do Banco da Vitória conheceu um surto de progresso, quando então serviu como nosso primeiro porto fluvial.

Entre muitos que morreram afogados nas águas do tio Cachoeira, um deles ficou na história, foi o frade capuchinho Luiz de Grava, no dia 19 de abril de 1875, quando viajava de canoa com destino ao arraial de Tabocas.

Entre as ilhas formadas pelo rio Cachoeira, uma delas tem uma história muito conhecida. É a Ilha do Jegue, que já se chamou Ilha da Marimbeta, Ilha do Temístocles e Ilha do Capitão Aristeu. Ela no rio já existia quando da chegada de Félix Severino e Manoel Constantino, pioneiros da corrente migratória sergipana rumo às terras de Itabuna..

Em 1914, registra-se a primeira grande enchente do rio Cachoeira. Fortes chuvas desabaram sobre a região durante onze dias, causando destruição de tudo que existia próximo às suas margens. Itabuna sofreu com a enchente, ficando alagada em suas primeiras ruas. Comenta-se que ficou como a maior enchente até pouco tempo. .

Muitas enchentes seguiram-se a de 1914. Uma delas ficou famosa por servir de palco e cenário de um fato incomum. Um jegue ficou preso na “ Ilha do Capitão Aristeu”, que por isso mesmo passou a ser chamada “Ilha do Jegue”. Foi alvo da compaixão e curiosidade de gente que assistia das margens, durante quatro dias, o heroísmo do pobre animal, atemorizado com a subida das águas em torno da ilha. Entre urros e sustos, salvou-se, enfim, depois que as águas baixaram. Foi recebido por uma grande multidão que lhe deu as honras de um “herói”, quando pisou em terra firme de uma das margens do rio.

Em 1947, a ponte Lacerda, recém-construída, serviu de barragem para grande quantidade de “baronesas”, capim amazonas e outras plantas aquáticas, que o rio transportava em suas fortes correntezas. As águas represadas invadiram as partes mais baixas da cidade. Foi grande a destruição na Mangabinha, Burundanga, Bananeira, Berilo e outros bairros ribeirinhos.

Em 1964, novamente as águas do Cachoeira transbordaram em uma enchente que causou prejuízos nos mesmos lugares anteriormente atingidos. Ano depois, ou seja, 1965, mês de novembro, o Cachoeira invadia novamente Itabuna, chegando a alagar pela primeira vez a Avenida do Cinquetenário. Apesar dos grandes prejuízos, a enchente de dezembro de 1967, segundo registros históricos, foi muito superior a todas as outras. Seus estragos ainda estão bem vivos na memória dos mais velhos.

Fonte: “Documentário Histórico Ilustrado de Itabuna”, José Dantas de Andrade, Proplan, Itabuna, 1986.