19 de ago. de 2020

José Soares Pinheiro


O estilo político de José Soares Pinheiro - Pinheirinho - se manteve praticamente o mesmo desde os tempos de sua disputa com José de Almeida Alcântara na conquista da Prefeitura de Itabuna, em 1966.  Muita coisa mudou na ressaca do tempo, no forró politico.

No começo dos anos 80, Pinheirinho, assumiu a presidência do diretório municipal do PDS, na época o maior partido do ocidente, na presunçosa definição de Francelino Pereira, ex-governador biônico de Minas Gerais. Que fedentina era a política brasileira: cassações de mandatos, censura à imprensa, direitos humanos violentados.

Na direção do PDS - Partido Democrático Social - Pinheirinho isolava-se no escritório da sua empresa, na antiga Av. Ibicaraí, hoje avenida José Soares Pinheiro, onde recebia lideranças politicas e empresariais. Usava exageradamente o telefone, curvava-se em cima de relatórios, de estatísticas, de números econômicos, de documentos como uma maneira de atualizar-se e informar-se mais.

Pinheirinho era um politico muito confiável: quando dizia que ia fazer, fazia mesmo. Era um homem de decisões, determinado, diz José Carlito dos Santos, ex-presidente da Associação Comercial de Itabuna, um dos poucos amigos confidentes de Pinheirinho. Quando a indústria automobilística dava os seus primeiros passos no Brasil, Pinheirinho foi a São Paulo e conseguiu uma representação com os gringos da Willys, instalando uma agência em Itabuna. Uma delícia de visão empresarial. Fundou a J. S. Pinheiro & Irmãos, Ele, Tote, Rafael, David e Gabi, como é obvio, seus irmãos.

Como político, José Soares Pinheiro era considerado um político diferente, já que Itabuna sempre gostou de homens públicos populistas. Dificilmente Pinheirinho era visto em um bairro, na periferia. Tinha uma aparente rejeição às festas populares: Carnaval, São João. Era o seu estilo. Ele atuava com rara desenvoltura na cúpula, em circuito fechado, armando as decisões. Era um líder.

Na opinião de Farid Maron, Pinheirinho era homem público inclinado para o convívio fechado, solitário, hermético. Uma questão de temperamento, de formação, talvez de sofrimento depurado nas idas e vindas da gangorra política, da vida, mas era uma figura simples em todos os seus hábitos. Era um político magoado, decepcionado. Decepções e mágoas que ficaram ao longo do seu caminho palmilhado com trabalho sem nenhuma suspeita. Quando sentado na cadeira do poder, jamais foi subserviente, fraco. Exemplo expressivo foi sua renúncia da Presidência do Instituto de Cacau da Bahia, depois de alguns telefonemas desaforados, No outro lado da linha: Antônio Carlos Magalhães. O governador João Durval ainda tentou investidas conciliatórias. Em vão. Completamente em vão. Pinheirinho largou, resoluto, o cargo de presidente do ICB.

Pode-se dizer que todos os movimentos importantes da região, de Itabuna, teve a participação valiosa de Pinheirinho. Criação da Ceplac. Fundação do CNPC, da Associação Comercial, do Rotary, da antiga Guarda Noturna de Itabuna. Pinheirinho chegou ao ponto de pegar em armas para Combater o banditismo que na década de 50 perturbava a vida da cidade, o trabalho da polícia. Pinheirinho, Juca Sobrinho, Zeca do Porco, Tote Pinheiro, Daniel Rebouças caíram de pau no combate ao banditismo, liderados pelos filhos de alguns coronéis ilustres, ricos. Muitos dos bandidos terminaram processados, uns poucos na prisão. A reação liderada por Pinheirinho valeu, depois de muita luta, muito medo. Itabuna terminou respirando aliviada para trabalhar, para viver, progredir.

Pinheirinho era um dos poucos políticos do interior com embasamento ideológico, com uma visão internacional. Não tinha o discurso do político da província, curto, sensacionalista, demagogo. Pronunciava-se didaticamente, com conhecimento da causa levantada, com soluções. Fazia politica de cima para baixo, enquanto outros fazem de baixo para cima.

Tinhamos por aqui o pinheirismo, movimento político e social liderado por José Soares Pinheiro, naturalmente. Era uma chama, uma paixão, quase uma ideologia. Ele foi vereador, presidente do CNPC e de várias outras instituições, candidatou-se a deputado federal, seguindo uma estratégia partidária, depois de desentender-se com o seu aliado José Albuquerque Amorim, na época deputado federal dissidente do grupo. Tudo isso na década de 80. Pinheirinho fez a cara de boi feio para Amorim. Ambos foram derrotados, inclusive por Nicácio Figueiredo, enquanto o PMDB era coeso, em torno de Fernando Gomes, Daniel Gomes, Gutemberg Amazonas, Mário Padre.

Na sua trajetória política Pinheirinho fez e cultivou amizades importantes, firmes até o último momento de sua vida. Alguns deles: Angelo Calmon de Sá, Luiz Sande, senador Juthay Magalhães, no plano nacional. No municipal destacavam-se: Juca Sobrinho, Zeca do Porco, Calixto Midlej, José Carlito dos Santos, José Laurindo, José Gomes, José Albuquerque Amorim. O alagoano Amorim merece uma análise especial.

Há quem diga que Pinheirinho, lá no fundo de sua alma, considerava-se traído por Amorim. Foi um problema político que chegou a ameaçar a amizade pessoal muito forte existente entre ambos. Na ocasião, Amorim decidiu libertar-se da liderança de ACM. A decisão de Amorim, aliás, bem recebida na área bem mais informada mantendo-as longe da população desagradou ao PDS.

Os riscos do presidente do PDS
Em 1980, antes de assumir à presidência do PDS de Itabuna, Pinheirinho estava absolutamente convencido dos riscos que iria correr, enfrentar. O governo do presidente Figueiredo fez algumas aberturas democráticas, anistiou políticos, sepultou o famigerado Ato Institucional N° 5. Então, um novo tempo se abriu, um novo espaço político se formou. Pinheiro teria de conviver, adaptar-se com um novo tempo, uma nova realidade política-partidária. Conviver até com históricos adversários políticos adquiridos ao longo de sua fascinante vida pública.

Ora, mesmo consciente dos problemas, Pinheirinho teve a dignidade de não se entregar aos caprichos do passado, como sempre acontece com os políticos noviços, imaturos, inexperientes. Tinha nas mãos uma missão partidária de alta importância. E com sabedoria política conseguiu conviver com Mário Cézar Anunciação, Antônio Menezes, Manoel Leal e até com Félix Mendonça, de quem Pinheirinho também foi decidido adversário.

Com as mãos estendidas, estimulou o diálogo de todas as correntes do PDS, através de uma tolerância santificada buscou o entendimento. Entendeu-se com Manoel Leal, superintendente da Sulba, contornou solicitações exageradas de Antônio Menezes. Conversou bem com Mário Cézar Anunciação, saiu-se bem de sua missão.

Indo ao passado, observando os fatos políticos de 1976 a 1981, houve uma evolução política em José Soares Pinheiro, quando aposentou do seu temperamento as radicalizações desnecessárias, sepultando o passado político sobrecarregado de ressentimentos e mágoas, diante do qual ele foi o grande personagem. Pinheirinho conseguiu revitalizar-se para os novos tempos, via negociações políticas legítimas, francas, diretas, quando numa época política difícil seus correligionários do PDS, onde havia um conflito de idéias.

Nos últimos anos de sua vida, Pinheirinho aparentara ter optado por uma solidão politica premeditada. Ele sabia que tinha dois, no máximo, trés amigos dentro da estrutura viciada do PDS de Itabuna. O resto eram amizades politicas, das circunstâncias políticas do momento, que aumentam ou diminuem de acordo com o prestigio dos poderosos de plantão.

José Soares Pinheiro morreu em 28 de agosto de 1988 com um sonho irrealizável: ser prefeito de Itabuna. Agora é tarde, mas ele mudou, em ocasiões graves, a nossa história.

| HISTORIADEITAUNA.COM.BR
| Texto publicado originalmente no Jornal Agora, 28/07/1993